Derrubada do direito ao aborto consolida os EUA como um campo ideológico de batalha
Estados conservadores acionam leis restritivas enquanto os progressistas se articulam para acolher mulheres que recorrem à interrupção da gravidez. Mulher chora após decisão do aborto nesta sexta-feira, 24, do lado de fora da Suprema Corte em WashingtonSteve Helber/APAssim que a decisão da Suprema Corte dos EUA foi revelada, procuradores de estados conservadores como Missouri, Texas e Louisiana acionaram suas leis antiaborto, proibindo efetivamente a interrupção da gravidez. Em contrapartida, os procuradores de unidades progressistas, como Nova York e Illinois, tentaram assegurar às mulheres que o seu direito de escolha será preservado. É nesse campo de batalha que os EUA se consolidam, com a derrubada de um direito constitucional que vigorava há meio século no país. A morte anunciada de Roe v. Wade, só foi possível a partir da reconfiguração patrocinada pelo ex-presidente Donald Trump, que imprimiu ao mais alto tribunal o viés conservador para as próximas gerações. Manifestantes contrários ao direito ao aborto se reúnem do lado de fora da Suprema Corte em WashingtonGemunu Amarasinghe/APGraças aos juízes nomeados durante o seu mandato, prevaleceu a tese de que o direito ao aborto estabelecido em 1973 é um erro, como decidiu, por 6 a 3, esta manhã a Suprema Corte. “O tribunal fez algo que nunca fez antes: reverter um direito constitucional”, resumiu Joe Biden. O presidente defendeu a restauração de Roe v. Wade como legislação federal, mas a configuração atual do Congresso torna inviável esta mudança. A questão divide o país geograficamente em dois pólos irreconciliáveis. A anulação deste direito reverbera imediatamente em metade dos estados, prontos para restringir ou proibir drasticamente a interrupção da gravidez. Põe em situação vulnerável cerca de 36 milhões de mulheres em idade reprodutiva, que precisarão cruzar fronteiras para fazer um aborto em um estado que preserve o direito. Manifestantes protestam em frente à Suprema Corte contra revogação de direito ao abortoComo definiu a procuradora-geral Letitia James, de Nova York, os americanos estão diante de um dos momentos mais sombrios de sua História. “Não se engane: enquanto outros estados retiram o direito fundamental de escolher, Nova York sempre será um porto seguro para quem procura um aborto.” Não é tão simples. Grupos de defesa da interrupção da gravidez alertam sobre penalizações às mulheres que recorram a outros estados para chegar à clínica mais próxima. “Eu vou combater qualquer lei que proíba o livre trânsito de mulheres em busca do aborto”, afirmou o presidente. A decisão dos magistrados colide com a opinião da maioria dos americanos. Uma pesquisa patrocinada por respeitadas instituições americanas, como Harvard, Stanford e Universidade do Texas, e realizada no início do mês revelou que 62,3% se opõem à derrubada da decisão Roe v. Wade, concretizada pela Suprema Corte. Mas, para reverter a decisão, só há um caminho, conforme ressaltou Biden – o do voto, em novembro.