O que espera Ortega em quarto mandato na Nicarágua

O que espera Ortega em quarto mandato na Nicarágua
Sem credibilidade, ditador assegura reeleição à custa da perseguição de opositores, mas não escapará de sanções. Daniel Ortega, presidente da Nicarágua, em foto no dia da Independência do país, 15 de setembro de 2020

Presidência da Nicarágua/Cesar Perez/Handout via Reuters

Daniel Ortega se reelege neste domingo (7) ao quarto mandato consecutivo na Nicarágua, num pleito sem disputa e sem observadores. Os cinco candidatos que concorrem com ele fazem figura na cédula, apenas para dar uma falsa aparência de legitimidade à eleição. Seus reais opositores estão na prisão, no exílio ou na clandestinidade, alijados do processo de antemão considerado fraudulento por EUA, União Europeia e principais organismos internacionais.

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No poder desde 2007, o ex-guerrilheiro que se consagrou ditador emerge novamente das urnas sem credibilidade interna, após esmagar as instituições do Estado, perseguir opositores e sufocar a mídia. Perpetua-se no poder com a ajuda da mulher Rosario Murillo, transformada em co-presidente, com quem avança, sem problemas, em seu projeto de perpetuar-se no cargo.

Iniciará um novo mandato sob pressão da comunidade internacional para libertar os sete concorrentes que tentaram desafiá-lo e foram processados como traidores da pátria, sob acusações de lavagem de dinheiro ou terrorismo. Ortega e Rosario tentarão usar os presos políticos como moeda de troca para evitar novas sanções, prometidas pelos EUA e pela União Europeia.

Homem passa por um outdoor de propaganda do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, no início da campanha para as eleições presidenciais, em Manágua, em setembro

Reuters/Maynor Valenzuela

A dupla, assim como os principais assessores do governo sandinista, será alvo de duras punições, conforme a lei aprovada esta semana pelo Congresso americano e batizada de Renacer (Fortalecer a Adesão da Nicarágua às Condições para a Reforma Eleitoral).

A legislação deverá ser sancionada pelo presidente Biden e prevê também mais supervisão dos empréstimos das instituições financeiras internacionais ao país. Numa ação bipartidária, os congressistas recomendam ao governo que reveja a participação da Nicarágua no Tratado de Livre Comércio entre Estados Unidos, América Central e República Dominicana (Cafta).

A suspensão do país, no entanto, é complicada e impõe um dilema ao presidente americano. Principal parceiro econômico da Nicarágua, os EUA compram quase metade das exportações do país e fornecem 22% de suas importações.

A saída do Cafta estrangularia ainda mais a economia da Nicarágua, que registrou retração de 2% no ano passado. Afetaria diretamente a população, provocando a expulsão de uma nova leva de migrantes na direção dos EUA. Desde junho, pelo menos 38 mil nicaraguenses chegaram à fronteira americana, movidos pela violência do regime.

O continente ainda se divide em relação a Ortega, que tem em Cuba e Venezuela seus principais aliados. Sete países, entre os quais México, Argentina, Guatemala e Honduras, se abstiveram na votação da resolução da OEA exigindo a realização de eleições livres e a libertação imediata dos candidatos presos.

Motoqueiro passa em frente a cartaz com Daniel Ortega em Manágua, em 2 de novembro de 2021

Oswaldo Rivas / AFP

O ditador nicaraguense vem fortalecendo laços com a Rússia, outra preocupação para o governo Biden, que tenta evitar a expansão de sua influência no continente. A Lei Renacer recomenda ao governo americano que intensifique os relatórios de inteligência sobre as atividades da Rússia na Nicarágua, incluindo vendas de armas e tanques ao país.

O uso da máquina estatal para mudar leis, que serviram de pretexto para minar os instrumentos democráticos, fez com que Ortega chegasse impune ao dia da eleição e assegurasse sua vitória antes mesmo do primeiro voto.