Em Brasília, jornalistas russos ligados a instituições que ganharam o Nobel da Paz pedem posição mais firme do Brasil contra a guerra

Em Brasília, jornalistas russos ligados a instituições que ganharam o Nobel da Paz pedem posição mais firme do Brasil contra a guerra
Jornalistas russos deram entrevista coletiva durante passagem por Brasília

Paloma Rodrigues/ TV Globo

Dois jornalistas russos, Pavel Andreyev e Kirill Martynov, de instituições que foram laureadas com o Nobel da Paz estão no Brasil para falar com autoridades sobre a guerra na Ucrânia e pedir uma posição mais firme do Brasil em relação à Rússia.

Pavel Andreyev é da organização de direitos humanos Memorial, ganhadora do Nobel no ano passado, e Kirill Martynov do jornal independente "Novaya Gazeta", que foi premiada em 2021.

Um terceiro jornalista russo, Konstantin Eggert, participa da viagem aos países latinos como um mediador dos eventos.

Os jornalistas estão em uma série de viagens pela América Latina organizada pela União Europeia. Depois de passarem por Uruguai e Argentina, chegaram a Brasília nesta semana.

O grupo tem encontro marcado com representantes do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como a chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, e do Itamaraty, além de parlamentares. Na sequência, o grupo vai a São Paulo e segue para o Chile, última parada na América do Sul.

Em entrevista à TV Globo, eles dizem acreditar que o Brasil pode ter um papel influente na resolução do conflito.

"Eu acho que todo país no mundo - e um país tão importante como o Brasil que é muito respeitado na área dos direitos humanos e democracia, que é algo que perdemos totalmente na Rússia durante os últimos anos sob o presidente Putin -, eu acho que toda democracia forte no mundo tem que compartilhar mensagens fortes para o presidente russo, [de que] esse tipo de guerra é inaceitável", afirmou Martynov.

"Eu entendo as ideias que o Brasil tem sobre ter relações normais com todos os países no mundo, isso é totalmente compreensível pra mim, mas ao mesmo tempo eu acho que ninguém pode ter relações normais com pessoas que sempre quebram as regras", disse.

Pavel Andreyev, da Memorial, acredita que o Brasil deveria ampliar sua participação na dissolução do conflito.

"Eu acho que o papel do Brasil deveria crescer, mas devem entender que "paz a qualquer preço" também não é aceitável, porque sem resolver as questões de direitos humanos não será possível manter essa paz. Então os interesses dos dois países devem ser discutidos", disse. "Eu acho que é muito importante que todos os países prestem atenção a esse tópico para pressionar o Kremlin a ir para a mesa real das discussões pela Paz."

Autoexílio

Atualmente, a atuação dos jornalistas é feita de fora da Rússia. Eles falaram da pressão que sofreram enquanto atuavam no país natal e disseram que a única opção que consideraram possível foi o autoexílio. "Em março de 2022, nós tínhamos que escolher entre ir pra prisão e parar de trabalhar como jornalistas, ser totalmente silenciados, ou ir para o exílio e trabalhar de um país diferente", disse Kirill Martynov. "Optamos pela segunda opção, estamos no exílio."

Ele explica que o seu jornal, o "Novaya Gazeta", ainda tem repórteres que atuam de maneira anônima na Rússia que enviam informações anônimas para a equipe que atua no exterior. Kirill Martynov atua na Letônia, de onde coordena a operação. "Nós publicamos histórias do exterior e tentamos levar informações de volta para os russos, porque esse é o único jeito que temos de informar nosso povo sobre o que realmente acontece no nosso país."???

Já a Memorial, organização internacional de defesa dos direitos humanos fundada na Rússia em 1989, foi banida da Rússia em 2022 por uma decisão da Suprema Corte, mesmo ano em que foi reconhecida pelo Nobel. A alegação foi o descumprimento da lei sobre "ação de agentes estrangeiros".

A Rússia aprovou uma lei que obriga sites com alguma influência de países ou instituições estrangeiras a colocarem banners em toda publicação avisando de ação de agentes estrangeiros. A lei se tornou ainda mais restrita no final do ano passado, e recebeu mais críticas de organizações de defesa dos direitos humanos e liberdade de imprensa.