A guerra da Ucrânia vai acabar logo? Veja os fatores que podem determinar o rumo da invasão

A guerra da Ucrânia vai acabar logo? Veja os fatores que podem determinar o rumo da invasão
Segundo principais análises, conflito deve se prolongar por 2023 e ter mais protagonismo dos EUA e Europa, de um lado, e da China, de outro. Mulher caminha diante de prédio atingido por bombardeio russo em Mariupol, no sul da Ucrânia, em março de 2022.

Evgeniy Maloletka/ AP

Indo direto ao ponto, é pouco provável que a guerra na Ucrânia, que completa um ano nesta sexta-feira (24), termine em 2023, segundo as principais análises e previsões.

O que inicialmente se previa como um conflito de alguns dias, no máximo semanas, deve se arrastar ao longo de 2023 para terminar com a maior parte dos territórios ucranianos que foram invadidos recuperados e, mais globalmente, uma profunda rachadura entre Ocidente e Oriente.

Empacada, a guerra não deve ter um desfecho este ano. No lugar disso, especialistas preveem grandes ofensivas de ambas as partes, ainda mais polarizadas pelo apoio cada vez maior dos Estados Unidos a Kiev e por uma parceria cada vez mais possível entre Rússia e China.

Por isso, a invasão que a Rússia previa ser efêmera se concretizará como o primeiro grande choque entre Ocidente e Oriente desde a Guerra Fria.

Essas são as principais análises de estudos, institutos e especialistas que pesquisam a guerra da Ucrânia.

7 de abril - Um civil usa uma máscara de Vladimir Putin, enquanto um soldado ucraniano fica em cima de um tanque russo destruído em Bucha, Ucrânia

Rodrigo Abd/AP

Veja algumas possibilidades que especialistas desenham para 2023 (e leia mais sobre eles abaixo):

Estados Unidos e Europa entrarão ainda mais na guerra com envio de armamentos mais pesados e potentes

A China deve ganhar protagonismo e ter participação, mesmo que indireta de Pequim, do lado russo

No campo de batalha, a Rússia deve investir em garantir permanência em territórios ucranianos conquistados

A Ucrânia pode conseguir reconquistar boa parte das cidades e regiões invadidas, amparada pela forte maquinaria do Ocidente

A região da Crimeia, no entanto, é a grande incógnita

Em um cenário menos provável, Moscou avança para o Ocidente, respondendo ao envio de armas dos EUA e Europa para Kiev

Também pouco provável, mas no radar de especialistas, está a entrada direta de Estados Unidos e Europa na guerra

O maior conflito será em torno dos territórios ocupados pela Rússia ao longo do ano passado. Segundo o Instituto para o Estudo da Guerra, dos Estados Unidos, as tropas de Moscou investirão pesado para resistir nas cidades e vilarejos que ainda controla, e, em um segundo momento, avançarão na tentativa de reconquistar os perdidos para a Ucrânia no ano passado.

Desde que lançou uma forte ofensiva para reconquistar territórios ocupados pela Rússia, em julho do ano passado, a Ucrânia já recuperou cerca de 18 mil quilômetros quadrados, segundo as estimativas do governo ucraniano.

Mas a Rússia conquistou, no total, cerca de 160 mil quilômetros quadrados dentro do país vizinho, e a avaliação principal é que essa quantidade de território deve dar a Moscou tempo hábil de resistir ao longo de 2023.

Estados Unidos

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, durante discurso em Varsóvia, na Polônia, em 21 de fevereiro de 2023.

Evan Vucci/ AP

No que depender do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, seu país se tornará o grande sócio da Ucrânia na guerra - só nesta semana, ele fez uma visita surpresa à capital ucraniana, a primeira desde o início da guerra, anunciou um novo pacote de ajuda militar de mais de R$ 2,5 bilhões e deu um grande discurso a céu aberto com direito a show de luzes na vizinha Polônia.

Dias antes, sua vice, Kamala Harris, acusou a Rússia de crimes de guerra, pela primeira vez em quase um ano.

Mas Biden pode tropeçar em pedras colocadas dentro de sua própria casa: a oposição, que hoje comanda a Câmara dos Deputados do país. Deputados republicanos têm dado sinais de querem começar a barrar o apoio à Ucrânia.

Desde o início da guerra, os Estados Unidos já destinaram mais de R$ 273 bilhões ao governo de Volodymyr Zelensky.

Atualização das estruturas de guerra russas

Outdoor em São Petersburgo, na Rússia, exibe a foto de um soldado russo recrutado para a guerra na Ucrânia. 3 de janeiro de 2023.

AP - Dmitri Lovetsky

Depois de ter recrutado mais tropas no ano passado, convocando reservistas, Putin deve investir, ao longo deste ano, em tecnologia de guerra, que ficou parada na Guerra Fria, segundo disse à rede americana CNN o general David Petraeus, o ex-diretor da CIA e um dos comandantes das tropas norte-americanas no Afeganistão e no Iraque.

Na avaliação de Petraeus, um dos principais fatores que impediram a Rússia de avançar não foram apenas a resistência das tropas ucranianas e o respaldo militar do Ocidente, mas também uma série falhas na cultura militar das próprias Forças Armadas russas.

De falta de organização de equipes, passando por pouco treinamento e equipamento precário, essas falhas devem começar a ser corrigida por Putin, segundo Peatrus.

“A dispendiosa campanha militar da Rússia na Ucrânia”, segundo o Instituto para o Estudo da Guerra, “provavelmente esgotou significativamente o equipamento russo e as reservas de mão de obra necessárias para sustentar uma ofensiva de grande escala bem-sucedida no leste da Ucrânia”.

Do outro lado, a Ucrânia sabe que leva vantagem em termos tecnológicos. O país inaugurou a primeira guerra "em código aberto", termo que começou a ser usado para se referir à estratégia do governo de Volodymyr Zelensky de usar meios tecnológicos para se comunicar com o Ocidente e contar seu lado da história.

Dias antes de a guerra estourar, por exemplo, Zelensky pediu a todos os governos regionais que abrissem seus próprios canais de Telegram, o meio pelo qual conseguiram comunicar detalhes de ataques russos quase em tempo real ao resto do mundo.

'Isso não é um blefe', diz Vladimir Putin durante pronunciamento

O Kremlin foi no caminho contrário. Não falou de guerra e tentou esconder o que chamou de "operação militar especial" da maioria de seus cidadãos, bloqueando canais de comunicação. Esse cenário, no entanto, mudou em setembro, quando Putin, já precisando de mais tropas, foi à TV anunciar que convocaria 300 mil reservistas, entre eles pessoas que sequer haviam tido treinamento militar.

Sem querer, ele levou a guerra para dentro de seu país, e, segundo análises, aprendeu, com isso, que não pode mais escondê-la dos russos. No lugar disso, vem investindo internamente na narrativa de que está apenas se defendendo das tentativas expansivas de países do Ocidente.

Europa

A Europa, de certa forma, vê seu futuro no desempenho da Ucrânia, que, geograficamente, funciona como uma espécie de barreira geográfica do continente com a Rússia.

Por isso, os países da União Europeia concordaram em aumentar o apoio a Kiev ao longo de 2023.

A Alemanha, que resistia em enviar armas à Ucrânia, anunciou a doação de tanques Leopard 2. Nesta semana, a Espanha fez o mesmo. Já o Reino Unido anunciou na semana passada que enviará armas de longo alcance - é o primeiro país do mundo a ceder a Kiev esse tipo de armamento.

No ano passado, o apoio europeu havia se concentrado em amplos pacotes de sanções à Rússia e o envio de armas e equipamentos militar menos pesados.

Tanque Leopard 2 dispara durante exercício militar na Letônia em 29 de setembro de 2022

REUTERS/Ints Kalnins

A China surge no cenário

Na última semana, a possível parceria da China com a Rússia deixou de ser uma possibilidade que poderia se concretizar ao longo de 2023 para um cenário cada vez mais claro.

Na terça-feira (21), Putin defendeu abertamente - pela primeira vez desde o início da guerra - uma parceria mais efetiva com Pequim contra o Ocidente.

Horas depois, funcionários dos governos dos dois país afirmaram que o líder chinês, Xi Jinping, irá a Moscou nos próximos meses para uma reunião bilateral com o presidente russo - também a primeira desde o início da guerra.

Putin e Xi em Pequim, em fevereiro de 2022

Sputnik/Aleksey Druzhinin/Kremlin via REUTERS

No dia seguinte, o chanceler chinês, Wang Yi, visitou Moscou, se reuniu com Putin e falou em “aprofundar os laços com a Rússia”.

Embora se saiba pouco sobre a capacidade militar chinesa, a parceria pode ser uma tentativa da Rússia de conseguir mais equipamentos, principalmente tanques – segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, do Reino Unido, a Rússia perdeu metade de seus tanques pesados, que são estratégicos para resistir nos territórios ocupados.